domingo, 29 de março de 2009

Surgimento, Expansão e Tamanho do Universo


Dando seqüência às postagens sobre minhas divagações quântico-filosóficas, posto mais um artigo relacionado a um texto anterior, A Chave de uma Fronteira. Devo lembrar que fiz essa divisão de temas para os textos ficarem mais claros e concisos. Sei que essa discussão parece divergente aos assuntos que proponho discutir aqui, mas eles fazem uma ponte extremamente firme ao que penso em relação ao mundo, às artes, ao espaço e ao Deus em que vivemos.

Nesta segunda postagem, trago a discussão acerca do surgimento, expansão e tamanho do universo. O big bang foi uma explosão tão rápida quanto imaginamos?! Sim, mas dadas as distorções de tempo, podemos esmiuçar cada detalhe das 43 partes que dividem o primeiro segundo após a explosão original. Antes desse primeiro segundo, a física perde os pés, pois nada de exato e calculável há.


A Teoria do Big Bang

Iniciemos nossos pensamentos seqüencialmente. Para calcular a expansão do universo, basta medirmos a velocidade de afastamento das galáxias, e assim deduzirmos o momento primordial em que elas se encontravam reunidas num certo ponto, aproximadamente como se víssemos um filme de trás para frente. Retrocedendo esse filme cósmico imagem por imagem, acabaremos por descobrir o momento exato em que o Universo inteiro tinha o tamanho de uma cabeça de alfinete. É nesse instante, imagino, que devemos situar os primórdios de sua história.

Os astrofísicos tomam como ponto de partida os primeiros bilionésimos de segundo que se seguiram à criação. Portanto, estamos a 10-43 segundo depois da explosão original. Nessa idade fantasticamente pequena, o Universo inteiro, com tudo o que irá conter mais tarde – as galáxias, os planetas, a Terra, suas árvores, a famosa chave do texto anterior – tudo isso está contido numa esfera inimaginavelmente pequena: 10-33 centímetro, ou seja, bilhões de bilhões de vezes menor que um núcleo atômico.

Nota: A título de comparação, o diâmetro de um núcleo é de apenas 10-13 centímetro.

A Origem
A densidade e a grandeza desse universo original atingem proporções que o espírito humano não pode apreender: uma temperatura absurda, de 1032 graus, ou seja, 1 seguido de 32 zeros. Estamos diante do “limite de temperatura”, uma fronteira de calor extremo, além da qual nossa física desmorona. Nessa temperatura, a energia do Universo nascente é monstruosa; quanto à “matéria” – se é que se pode dar um sentido a essa palavra – é constituída de uma sopa de partículas primitivas, antepassadas distantes dos quarks, partículas que interagem continuamente entre si. Não há ainda qualquer diferença entre essas partículas primárias, que interagem todas do mesmo modo. Nesse estágio, as quatro interações fundamentais (gravitação, força eletromagnética, força forte e força fraca) ainda estão indiferenciadas, confundidas numa só força universal.

Tudo isso num universo que é bilhões de vezes menor que uma cabeça de alfinete! Essa época é talvez a mais insólita de toda história cósmica. Os eventos se precipitam num ritmo alucinante, a tal ponto que nesses bilionésimos de segundo acontecem mais coisas que nos bilhões de anos que se seguirão.

Um pouco como se essa efervescência dos primórdios se assemelhasse a uma espécie de eternidade. Se seres conscientes tivessem podido viver esses primeiros tempos do cosmo, certamente teriam tido a impressão de que um tempo imensamente longo, quase eterno, separava cada evento.

Expansão

Por exemplo: um evento que percebemos hoje sob a forma de um flash fotográfico equivalia à duração de bilhões de anos, nesse universo nascente. Naquela época, a extrema densidade dos acontecimentos produz uma distorção da duração. Após o instante original da criação, bastam alguns bilionésimos de segundo para que o Universo entrasse numa fase extraordinária, que os físicos chamam de “era inflacionária”. Durante essa época fabulosamente breve, que se estende de 10-35 a 10-32 segundo, o Universo infla por um fator de 1050. Seu comprimento característico passa do tamanho de um núcleo atômico ao de uma maçã de dez centímetros de diâmetro. Essa expansão vertiginosa é bem maior de que aquela que virá depois: da era inflacionária até hoje. O Universo não aumentou mais que por um fator relativamente pequeno: 109, ou seja, apenas um bilhão de vezes.

Nota: Precisamos aqui apreender visualmente, por mais difícil que pareça, que o desvio da escala existente entre uma partícula elementar e uma maçã é proporcionalmente bem maior do que aquela que separa a dimensão de uma maçã e a dimensão do Universo observável.

Portanto, no colocamos diante de um Universo do tamanho de uma maçã. O relógio cósmico indica 10-32 segundo: a era inflacionária acaba de terminar. Nesse instante existe apenas uma partícula, à qual os astrofísicos deram o nome poético de “partícula X”. É a partícula original, aquela que precedeu todas as outras. Seu papel consiste simplesmente em veicular forças. Se alguém tivesse a possibilidade de observar o Universo nesse naquele momento, teria constatado que aquela “maçã” inicial era perfeitamente homogênea, isto é, não passava de um campo de forças que ainda não continha a mínima parcela de matéria.

A 10-31 segundo, alguma coisa acontece. As partículas X dão origem às primeiríssimas partículas de matéria: os quarks, os elétrons, os fótons, os neutrinos e suas antipartículas. Lancemos o olhar sobre esse Universo nascente: ele atinge agora o tamanho de uma bola grande. As partículas que existem nessa época dão origem a flutuações de densidade que desenham, aqui e ali, estrias, irregularidades de todos os tipos.

Devemos nossa existência a essas irregularidades. Pois essas estrias microscópicas se desenvolvem para gerar, bem mais tarde, as galáxias, as estrelas e os planetas. Em suma, em alguns bilionésimos de segundo a tapeçaria cósmica das origens gera tudo o que conhecemos hoje.

Felipe de Moraes
Concluído em 26 de março de 2009
Baseado nos pensamentos do livro Deus e a Ciência,
Jean Guitton, Irmãos Bogdanov; Editora Nova Fronteira

domingo, 15 de março de 2009

Mahler - Sinfonia n.º 4

Gustav Mahler
Sinfonia 4 em Sol maior


Hoje faço uma postagem um tanto diferente. A Sinfonia 4 em Sol maior, de Gustav Mahler. Mas vocês me perguntam: “o que há de diferente nisso?!”. E eu respondo: “uma pintura para cada movimento da sinfonia.” Num momento de inspiração artístico-musical, peguei fotos que eu tenho de obras de arte tumular do Cemitério da Consolação e executei pinturas singelas em guache sobre canson. O resultado é o que posto aqui hoje, juntamente com a Sinfonia, obviamente, para análise e contemplação do resultado.


A quarta sinfonia de Mahler foi composta entre 1893 e 1896, mas estreou somente em 1901. Curiosamente, a obra começou a ser escrita pelo quarto movimento, originalmente concebido como passagens na terceira sinfonia. Mahler, entretanto optou por escrever uma nova sinfonia tomando por base essa composição, acrescentando-lhe as três partes iniciais.


Sinfonia 4, Primeiro Movimento, Mahler

O primeiro movimento é absolutamente clássico na forma, com suas três seções principais (exposição, desenvolvimento e recapitulação) claramente delimitadas. Até mesmo a escolha das tonalidades em que são expostos os dois temas principais (tônica e dominante, respectivamente) é rigorosamente formal, tal como numa sinfonia de Haydn. Chama a atenção, entretanto, a figura inicial dos guizos (instrumentos tradicionalmente atrelados a cavalos), que parece convidar o ouvinte para uma longa viagem. De fato, esses mesmos guizos aparecerão novamente no quarto movimento, onde se conhecerá o destino da viagem. Uma breve prévia de temas da Sinfonia 5 em Do sustenido menor se desenha, apresentando sugestões que serão melhor trabalhadas nessa sinfonia alguns anos depois. A pintura que executei inspirada nesse movimento foi um anjo sentado sobre um globo, onde ele observa algo no céu cima dele. A exploração de algo que ainda não sabemos, de uma viagem pelo desconhecido. A trombeta em seu colo repousa, marcando que algo certamente será anunciado.


Sinfonia 4, Segundo Movimento, Mahler

Também o segundo movimento tem forma clássica – um scherzo com dois trios. A inspiração aqui é uma pintura de Arnold Böcklin, intitulada “Freund Hein spielt auf” (O amigo Hein toca). O tal amigo Hein, esclareça-se, é uma representação alegórica da morte, que traz um inocente violino no lugar da foice. Com fina ironia, Mahler aqui escreve um solo de violino em scordatura (quando as cordas do violino são afinadas de maneira especial) que soa propositadamente estridente. Nos dois trios, o tom sarcástico do scherzo cede lugar ao ländler – danças folclóricas alemãs que lembram o antigo minueto. A pintura que executei é clara: a morte e seu violino, ao invés da foice. Sua forma lânguida, seus cabelos brancos e pele claríssima a tornam uma figura incomum, mas previamente reconhecível. Diferente do conceito de morte que nos é passado no decorrer da vida. Devo ressaltar, que Mahler não somente enchergava a morte de forma pesarosa e de perda, mas também a via de forma gloriosa, à qual deveremos chegar triunfantes e merecedore de sua graça. Quem desse violino a melodia ouvir, flanará com o que se decorre após.


Sinfonia 4, Terceiro Movimento, Mahler

O terceiro movimento, lento e melancólico, tem a placidez de uma lápide. O tema principal, inicialmente apresentado pelos violoncelos, passa por diversas variações em que o ritmo vai se intensificando. Este tema é às vezes intercalado por outro em que se cria no ouvinte uma expectativa frustrada: quando se espera o clímax, sobrevém na verdade o colapso de toda música. Esta atitude é muito comum na obra de Mahler. Pouco antes do final deste movimento, entretanto, aparece um exuberante clímax verdadeiramente mahleriano, na tonalidade de mi maior, justamente aquela em que se encerrará a sinfonia. A pintura aqui nos passa algo de total perda e tristeza. Como uma lápide, a imagem esguia apenas lamenta, sem lágrimas. Parafraseando uma passagem famosa de Drummond, "A vontade de chorar é tanta, que perplexa ela se cala."


Sinfonia 4, Quarto Movimento, Mahler
Das Himmlisches Leben


O quarto movimento é o ponto focal da sinfonia. Aqui aparece a soprano solista, cantando “Das himmlische Leben” (A Vida no Paraíso) – poema popular alemão, de autoria desconhecida, parte do ciclo “Des Knaben Wunderhorn” (O Garoto e sua Trompa Mágica), utilizado por Mahler em várias composições. “Das himmlisches Leben” é o canto de uma criança que morreu e nos descreve o paraíso, com suas comidas deliciosas e abundantes, seus personagens e afazeres, sua música perfeita. As estrofes são intercaladas por breves interlúdios orquestrais, onde se sobressai o guizo do primeiro movimento. Nas duas primeiras estrofes a música vai se esvanecendo, terminando em total placidez nas notas mais graves da harpa e do contrabaixo. Na pintura desse anjo que executei, passo o ritmo da melodia serena deste quarto movimento da sinfonia. Como se quem canta é ele, ou quem nos traz a melodia no ar é ele. A mão segura algo. O que?! Uma áurea de mistério. O que nos anuncia? A letra da música nos dira, mas muito suscintamente. Uma prévia do que Mahler acredita encontraremos.

Excertos de texto do Maestro Flavio Florence, titular da Orquestra Sinfônica de Santo André de 1988 até 2008, quando faleceu. Discussão e montagem por Felipe de Moraes.


Gustav Mahler, em foto de 1909

As sinfonias de Mahler costumam ser divididas em três períodos. E cada período faz com que as obras se relacionem entre si, tornando a produção artística de Mahler um universo único e constante que merece ser compreendido em sua totalidade.

As sinfonias do Primeiro Período são conhecidas como Sinfonias Wunderhorn, e abrangem as sinfonias 2, 3 e 4. Elas têm esse nome porque têm vínculos com as canções feitas por Mahler do ciclo de poemas conhecido como
Das Knaben Wunderhorn, já mencionados acima. Pode-se dizer que elas representam a busca de Mahler por uma fé firme e ao mesmo tempo uma busca para suas respostas acerca da existência.

A Sinfonia 1 usa elementos das canções do ciclo de poemas
Lieder Eines Fahrenden Gesellen (Canções de um Viajante Errante) e Das Klagend Lied (A Canção do Lamento). É puramente instrumental e também tem certa relação com Das Knabem Wunderhorn, ainda que de maneira mais indireta.

As sinfonias do Segundo Período, a 5, a 6 e a 7, costumam ser chamadas de Sinfonias Rückert. Elas têm esse nome porque a composição delas foi influenciada pelas canções que Mahler compôs sobre os poemas de Friedrich Rückert (1788-1866). Elas são puramente instrumentais e as mais trágicas do ciclo sinfônico.

O Último Período não tem nome e abrange as últimas obras do artista: as sinfonias 8, 9 e a inacabada 10, além da sinfonia canção
Das Lied von Der Erde (A Canção da Terra). A voz humana é usada em grande arte da Sinfonia 8, e ela costuma ser chamada às vezes de Sinfonia Coral.

As sinfonias 9 e 10 são instrumentais, e o poema sinfônico
Das Lied von Der Erde é cantado, ao redor do qual existe um certo mistério. A princípio era para ser a Sinfonia 9, mas por superstição, Mahler preferiu que fosse conhecida
como um poema sinfônico.

Abaixo, faço a postagem do pacote com a Sinfonia e um pequeno libreto com a letra do quarto movimento, como de costume. Mas infelizmente não tenho a partitura da Sinfonia 4, fico devendo e quando conseguir, farei novamente a postagem.

A interpretação que ouviremos é executada por Daniel Harding ao comando da Orquestra de Câmara Mahler, tendo como soprano solista Dorothea Röschmann, no quarto movimento. Gravação realizada nos dias 27 e 28 de janeiro de 2004, no Auditório G. Agnelli, no Centro Congressi Lingotto, em Turim, Itália.

Gosto muito dessa interpretação, ela explora profundamente a dinâmica, indo do extremo pianíssimo ao extremo fortíssimo. O colorido orquestral dos instrumentos é muito bem calculado e equilibrado. Uma referência para a interpretação dessa obra. Dorothea Röschmann não menos esbanja elegância, charme e intensidade interpretativa.

Mahler regendo

Download Aqui
Gustav Mahler (1860-1911)
Sinfonia n.º 4 em Sol maior
I – Bedächtig. Nicht eilen – Recht gemächlich
II – In gemächlicher Bewegung. Ohne Hast
III – Ruhevoll
IV – Sehr behaglich

Dorothea Röschmann,
soprano
Daniel Harding,
regência
Orquestra de Câmara Mahler


Das himmlisches Leben

Wir genießen die himmlischen Freuden,
d’rum tun wir das Irdische meiden.
Kein weltlich Getümmel
hört man nicht in Himmel!
Lebt alles in sanftester Ruh!

Wir führen ein englisches Leben!
Sind dennoch ganz lustig daneben!
Wir tanze und springen,
wir hümpfen und singen!
Sankt Peter im Himmel sieht zu!

Johannes das Lämmlein auslasset,
der Metzger Herodes drauf passet!
Wir führen ein geduldig’s,
unschuldig’s, geduldig’s,
ein lieblisches Lämmlein zu Tod!

Sankt Lukas den Ochsen tät schlachten
ohn’ einig’s Bedenken und Achten;
der Wein kost’kein Heller
im himmlischen Keller;
die Englein, die backen das Brot.
Gut’ Kräuter von allerhand Arten,
die wachen im himmlischen Garten!

Gut’ Spargel, Fisolen
und was wir nur wollen!
Ganze Schüsseln voll sin duns bereit!
Gut’ Äpfel, gut’ Birn’ und gut’ Trauben,
die Gärtner, die alles erlauben!
Willst Rehbock, willst Hasen?
Auf offener Straßen
sie laufen herbei!

Sollt ein Fasttag etwa kommen,
alle Fische gleich mit Freude angeschwommen !
Dort läuft schon Sankt Peter
mit Netz und mit Köder
zum himmlischen Weiher hinein.
Sankt Martha die Köchin muss sein!

Kein Musik ist ja nicht ayf Erden,
die unsrer verglichen kann warden.
Elftausend Jungfrauen
zu tanze sich trauen!
Sankt Ursula selbst dazu lacht!

Cäcelia mit ihren Verwandten
sind treffliche Hofmusikanten!
Die englischen Stimmen
ermuntern die Sinnen,
dass alles für Freuden erwacht.


A Vida no Paraíso

Nos divertimos com os deleites do Paraíso,
então evitamos todas as coisas terrestres.
Nenhum clamor mundano
é ouvido no Paraíso
Tudo vive na mais gentil paz!

Levamos uma vida angelical!
Mas somos completamente alegres!
Dançamos e saltamos,
saltitamos e cantamos!
São Pedro no Paraíso observa!

João deixa o pequeno cordeiro livre,
o açougueiro Herodes o vigia!
Conduzimos docilmente,
inocente, docilmente,
doce pequeno cordeiro à sua morte!

São Lucas o boi abate
sem sequer um pensamento ou cuidado;
o vinho custa nem um centavo
na adega do Paraíso;
os anjos, eles que assam o pão.
Finas ervas de variados tipos,
crescem no Jardim do Paraíso!

Requintados aspargos, feijões
e qualquer coisa que queiramos!
Pratos inteiros são para nós preparados!
Boas maçãs, boas peras e boas uvas,
os jardineiros, nos permitem tê-las todas!
Quer carne de veado ou de lebre?
Nas largas alamedas
eles correm livres!

Se o dia de jejum se aproxima,
todos os peixes vêm alegremente nadando!
Correndo vem São Pedro
com sua rede e suas iscas
dentro da lagoa divina.
Santa Marta deve ser a cozinheira!

Não há música na Terra
que possa ser comparada com a nossa.
Onze mil virgens
se lançam à dança!
Santa Úrsula, entretanto, ri!

Cecília e seus parentes
são excelentes músicos de corte!
As angelicais vozes
deleitam os sentidos,
para que todos acordem para a alegria.


Felipe de Moraes
14 de março de 2009

segunda-feira, 2 de março de 2009

Rachmaninoff - Concerto para Piano n.º 3

Sergei Vasilievich Rachmaninoff
Concerto para Piano n.º 3 em Re menor, Op. 30

Hoje estou inspirado. Todos os meus sentidos se afloram diante deste maravilhoso concerto para piano e orquestra que ouço inúmeras vezes sem me enjoar ou alterar minha postura diante de uma obra de tamanha magnitude. Rachmaninoff é o extremo Romântico, o tardio, o saudosista e extremamente intenso e melancólico. Não deixando a escola Romântica nem entrando na Moderna, Rachmaninoff faz uma ponte entre elas. Muitos elementos de sua música são Românticos, mas muitos são vanguardistas do Modernismo.

Inúmeros problemas pessoais na vida de Rachmaninoff, principalmente depressão, exílio e melancolia, tornam sua música intensa, fortíssima e extremamente tocante. Dotada de complexidade e técnica, são peças que certamente devem constar no patrimônio Universal por todo sempre.

Hoje, dado esse meu sentimento melancólico e de profunda admiração causados pelo Terceiro Concerto para Piano de Rachmaninoff, venho postá-lo e comentá-lo para vocês. E como não menos poderiam esperar de mim, posto também os arquivos dos movimentos em MP3 e a partitura do concerto inteiro, com um pequeno libreto, disponível para download pelo Rapidshare.

O Concerto para Piano e Orquestra n.º 3 em Re menor Op.30 de Rachmaninoff é famoso por suas exigências técnicas e musicais referentes ao intérprete. Este concerto tem a reputação de ser um dos mais difíceis concertos no repertório pianístico, sendo assim o favorito entre muitos pianistas virtuosos. Entretanto, o próprio Rachmaninoff citou sentir o Terceiro Concerto "f
luir mais facilmente nos dedos" do que o Segundo. As interpretações definitivas e que tomo como referência deste Terceiro Concerto foram executadas por Vladimir Horowitz, o qual o próprio compositor elogiou o domínio com o qual Horowitz executava a peça – "ele a engoliu inteira!", observou Rachmaninoff. E uma versão mais contemporânea executada por Vladimir Ashkenazy, a qual posto a gravação aqui, com a Orquestra Sinfônica de Londres sob a regência de Andre Previn.










Vladimir Ashkenazy e Andre Previn

Sem mais delongas, já posto o link abaixo, relembrando que o pacote vem com os três movimentos em formato MP3, a partitura em formato PDF e um libreto. Devo mencionar que como ainda utilizo o Rapidshare gratuitamente, o Pacote está disponível para 10 downloads. Se por ventura esses downloads se esgotarem, me enviem um comentário com e-mail de contato para o post que subo os arquivos novamente. A gravação é realizada por Vladimir Ashkenazy, com a Orquestra Sinfônica de Londres sob a regência de Andre Previn.

O Concerto











Download Aqui
Sergei Vasilievich Rachmaninoff
Concerto para Piano e Orquestra n.º3 em Re menor, Op.30
I - Allegro ma non troppo
II - Intermezzo: Adagio
III - Finale: Alla breve
Piano: Vladimir Ashkenazy
Regência: Andre Previn
London Symphony Orchestra


Seguindo a estrutura clássica de um concerto, a peça se apresenta em três movimentos.

O primeiro movimento, Allegro ma non troppo, desenvolvido na tonalidade de Re menor, inicia com uma melodia diatônica, que logo penetra em uma complexa figuração pianística. Esse movimento atinge numerosos ápices de intensidade e furor romântico, especialmente na cadência, que é minha passagem predileta deste concerto. Nessa passagem, o concerto introspecta-se apenas nas sonoridades do piano, delineando-se entre o pianíssimo e o fortíssimo extremos, onde o piano vibra, clama, chora. Um variação do tema é brilhantemente redefinida em moldes solo. O primeiro tema em sua forma pura reaparece apenas antes da coda. Rachmaninoff escreveu duas versões para a cadência desse concerto: uma primeira dramática e intensa, a original, comumente anotada como
ossia. E uma segunda mais leve, em estilo de toccata.

O segundo movimento, Intermezzo: Adagio, tem sua projeção na escalas de Fa sustenido menor e em Re bemol maior. Este movimento abre apenas com a orquestra e consiste de um número de variações sobre uma passional, extremamente romântica e simples melodia, sem seguir qualquer esquema rígido de construção. A melodia logo transita para a distante tonalidade de Re bemol maior, a qual nos introduz ao segundo tema. Após o desenvolvimento do primeiro tema e a recapitulação do segundo, a melodia principal do primeiro movimento reaparece, antes que o movimento seja encerrado pela orquestra de uma maneira similar à da introdução. Então o piano ganha a última palavra em uma curta passagem “cadenza-esque” a qual fará a transição para o último movimento, sem parada. Muitos pensamentos melódicos deste movimento aludem ao terceiro movimento do Concerto para Piano n.º 2 em Do menor, notoriamente ao gosto russo.

O terceiro movimento, Finale: Alla breve se desenvolve nas escalas de Re menor e Re maior. É rápido e vigoroso e contém muitos dos temas apresentados e utilizados no primeiro movimento, o que resulta assim na união da totalidade do concerto, ciclicamente. Entretanto, após o primeiro e segundo temas, o movimento diverge para a forma regular de sonata. Mas não há desenvolvimento convencional; este segmento é substituído por uma longa digressão que se utiliza da tonalidade maior na escala de Re do primeiro tema deste mesmo movimento, o que então o liga a dois temas do primeiro movimento. Após a digressão, a recapitulação retorna aos temas originais, construindo assim um ápice em forma de toccata bastante similares porém mais leves que a cadencia ossia do primeiro movimento. O último movimento é concluído com um triunfal e apaixonado segundo tema, em Re maior. A peça termina com as mesmas quatro notas rítmicas, aclamada por alguns como a assinatura musical de Rachmaninoff.

Na época, Rachmaninoff autorizou diversos cortes na partitura, para ser executada uma interpretação mais discreta. Estes cortes, particularmente no segundo movimento, eram comumente retirados das interpretações e gravações durante as décadas iniciais do século XX, considerando cada publicação. Mais recentemente, tornou-se usual interpretar o concerto sem os cortes. Uma interpretação típica do concerto completo demanda aproximadamente quarenta minutos.

História

Escrito no tranqüilo estado russo de Ivanovka, de onde era sua família, Rachmaninoff concluiu o concerto em 23 de setembro de 1909.






















O concerto é respeitado, em alguns casos temido por muitos pianistas. Józef Hofmann, o pianista a quem Rachmaninoff dedicou este concerto, nunca o executou publicamente, alegando que este “
não era para” ele. E Gary Graffman lamentou não ter aprendido este concerto como estudante, quando ele era “ainda tão jovem a ponto de não conhecer o medo”.

Devido ao limitado tempo, Rachmaninoff não pôde praticar o concerto enquanto esteve na Rússia. Assim, ele o praticou em um silencioso teclado que levou consigo no navio para os Estados Unidos.

O concerto teve sua primeira audição em 28 de novembro de 1909, pelas mãos do próprio Rachmaninoff, com a já extinta Sociedade Sinfônica de Nova York sob a regência de Walter Damrosch, no New Theater (mais tarde rebatizado de Century Theater). Este concerto recebeu uma segunda interpretação sob a responsabilidade de Gustav Mahler algumas semanas mais tarde, o qual Mahler definiu como uma “
experiência ao estimado Rachmaninoff”. O manuscrito teve sua primeira publicação em 1910 pela editora Gutheil.


Sergei Vasilievich Rachmaninoff

Em Russo,
Сергей Васильевич Рахманинов, nasce a primeiro de abril de 1873, e falece a 28 de março de 1943. Foi compositor, pianista e maestro russo, o último dos grandes expoentes do estilo Romântico na música européia. Sergei Vasilievich Rachmaninoff foi como o próprio compositor grafou seu nome quando viveu no ocidente, durante a segunda metade de sua vida.

Rachmaninoff é um dos pianistas mais influentes do século XX. Seus trejeitos técnicos e rítmicos são lendários, e suas mãos largas eram capazes de cobrir um intervalo de uma 13ª no teclado do piano (um palmo esticado de cerca de 30 centímetros), dado que o tamanho de sua mão correspondia à sua estatura, perto de 1,98m. Ele também possuía a habilidade de executar composições complexas à primeira audição. Muitas gravações foram feitas pela Victor Talking Machine Company, com o próprio Rachmaninoff executando composições próprias ou de repertórios populares.


Sua reputação como compositor, por outro lado, tem gerado controvérsia desde sua morte. A edição de 1954 do Dicionário Grove de Música e Músicos notoriamente desprezou sua música como "
monótona em textura... consistindo principalmente de melodias artificiais e feias" e previu seu sucesso como "não duradouro". A isto, Harold C. Schonberg em seu livro Vidas dos Grandes Compositores, respondeu, "é uma das colocações mais vergonhosamente esnobes e mesmo estúpidas a ser encontrada num trabalho que se propõe a ser uma referência objetiva". De fato, não apenas os trabalhos de Rachmaninoff tornaram-se parte do repertório padrão, mas sua popularidade tanto entre músicos quanto entre ouvintes vem, no mínimo, crescendo durante a segunda metade do Século XX, com algumas de suas sinfonias e trabalhos orquestrais, canções e músicas de coral sendo reconhecidas como obras-primas ao lado dos trabalhos para piano, mais populares.

A maioria de suas peças é carregada de melancolia, um estilo romântico tardio que remete ao estilo de Tchaikovsky.

Vida

Rachmaninoff nasceu em Semyonovo, perto de Novgorod, no noroeste da Rússia, em uma família nobre, descendente dos tártaros, que esteve a serviço dos czares russos desde o Século XVI. Seus pais foram pianistas amadores, e ele teve suas primeiras lições de piano com sua mãe. Por causa de problemas financeiros, a família se mudou para São Petersburgo, onde Rachmaninoff estudou no Conservatório da cidade antes de ir para Moscou. Deve-se observar que, no início, Rachmaninoff era considerado preguiçoso, faltando muito às aulas para ir patinar. Foi o rigoroso regime da casa de Zverev (que hospedou vários músicos jovens) que o disciplinou.






















Ainda jovem começou a mostrar grande habilidade em suas composições. Enquanto estudante, escreveu uma ópera em um ato, Aleko, o que lhe rendeu uma medalha de ouro em composição. Somando-se seu primeiro concerto para piano, um conjunto de peças para piano, incluindo o popular e famoso Prelúdio em Dó Sustenido Menor, sobre o qual o compositor ficou confuso com a fascinação do público, dado que tinha apenas 19 anos. Ele muitas vezes importunou pessoas da platéia perguntando "Oh, isto é mesmo necessário?” ou dizendo simplesmente não se lembrar dessa peça. Rachmaninoff confidenciou a Zverev seu desejo de compor mais, pedindo uma sala privativa onde ele poderia compor em tranqüilidade, mas Zverev via nele apenas um pianista e estreitou suas relações com o garoto. Após o sucesso de Aleko, entretanto, Zverev o aceitou novamente como compositor e pianista. Na verdade, suas primeiras peças sérias para piano foram compostas e executadas ainda como estudante, aos treze anos, durante sua residência com Zverev. Em 1892, aos dezenove anos, ele completou seu Concerto para Piano No. 1 Op. 1, de 1891, o qual revisou em 1917.

Rachmaninoff fez suas primeiras apresentações nos Estados Unidos como pianista em 1909, um evento para o qual ele compôs o Concerto para Piano No. 3 Op. 30, de 1909. Estas apresentações bem-sucedidas fizeram dele uma figura popular na América.

Nota: A melodia de abertura do Concerto para Piano No. 3 não é derivada de cânticos ortodoxos, um conceito errôneo que muitos músicos têm em mente. O próprio Rachmaninoff, quando perguntado, disse que ele mesmo a havia escrito.

Na medida em que Rachmaninoff constatava cada vez mais a certeza de não regressar mais à sua terra natal, foi sendo tomado por uma melancolia profunda. Muitas pessoas que chegaram a conhecê-lo somente nesta época o descreveram como o homem mais triste que eles já haviam visto. Numa entrevista em 1961, o maestro Ormandy declarou:

Rachmaninoff foi, na realidade, duas pessoas. Ele odiava sua própria música e estava geralmente infeliz ao executá-la ou conduzi-la para o público, então é este lado triste que o público conhece. Entretanto, entre seus amigos mais próximos, ele tinha um senso de humor muito bom e tinha um bom espírito.

Morte















Rachmaninoff morreu ouvindo música, em 28 de março de 1943, em Beverly Hills, na Califórnia, apenas alguns dias antes de seu aniversário de 70 anos, e foi enterrado em 1 de junho no cemitério de Kensico, em Valhalla. Nas horas finais de sua vida, ele insistia que podia ouvir música tocando em algum lugar por perto. Após ser repetidamente assegurado de que não era o caso, ele declarou: "
então a música está na minha cabeça".


Felipe de Moraes
01 de março de 2009